Começamos o mês de novembro destacando a data que fazemos memória de todos nossos ente queridos já falecidos. Para a hora da morte, a comunidade cristã têm ritos próprios para concluir de maneira cristã a trajetória daquele ente querido e para acompanhar a família na sua dor, na despedida e no fortalecimento da fé: Missa, rito de encomendação, bênção ao túmulo, etc. Mesmo depois, a comunidade cristã continua acompanhando os familiares na oração, através das Missa de 7º Dia, 30º e outras datas que são caras para a família. É neste contexto que, assim como lembramos ‘todos os santos’, originalmente no dia 1º de novembro, e agora no primeiro domingo de novembro, que também temos o dia 02 de novembro como data para recordar ‘todos os fiéis defuntos’. O que significa tudo isso? Significa colocar nossa vida e nossa morte no coração da nossa fé: fixar nosso olhar na páscoa de Cristo, na sua morte e ressurreição e, a partir disso, professar a fé cristã na ‘ressurreição da carne’.
Quando cremos na ressurreição, confiamos que em Deus tudo aquilo que perdemos será recuperado e transformado. Quando cremos na ressurreição, nos tornamos capazes de esperar pelo Senhor Jesus, “que transfigurará nosso corpo humilhado, conformando-o ao seu corpo glorioso” (Fl 3,21). Quando cremos na ressurreição, confiamos no poder que o Espírito Santo tem de dar vida ao seu corpo mortal (cf. Rm 8,11). Enfim, pelo fato de crermos na ressurreição, podemos dizer com o salmista: “Até o meu corpo repousará na esperança, porque não abandonarás minha vida no sepulcro (…). Deste-me a conhecer os caminhos da vida; tu me encherás de júbilo na tua presença” (Sl 16,8-11; At 2,26-28).
A fé na ressurreição enche o nosso coração da certeza de que nenhuma das perguntas ficará sem resposta, nenhuma dor ficará sem consolo, nenhuma ferida ficará sem ser curada e nenhuma lágrima ficará sem ser enxugada. A fé na ressurreição é a certeza de que a justiça que nem sempre encontramos neste mundo, encontraremos seguramente em Deus, pois Jesus afirma que todos ressuscitarão: “os que tiverem feito o bem, para uma ressurreição de vida; os que tiverem praticado o mal, para uma ressurreição de julgamento” (Jo 5,29).
“A fé na ressurreição enche o nosso coração da certeza de que nenhuma das perguntas ficará sem resposta, nenhuma dor ficará sem consolo, nenhuma ferida ficará sem ser curada e nenhuma lágrima ficará sem ser enxugada.”
A Ressurreição de Jesus – e a nossa, no final dos tempos – não é uma simples reanimação de um cadáver. Esse tipo de ressurreição – que seria melhor chamada de ‘reanimação’ – foi o que aconteceu com a filha de Jairo, o filho da viúva de Nain, com o amigo de Jesus, Lázaro. Foi um retorno à vida de antes. A ressurreição de Jesus, ao contrário, é criação nova, passagem a uma outra vida. O corpo de Jesus – e, um dia, o nosso – será animado pelo próprio Espírito de Deus e participará, em si mesmo, da vida de Deus. Paulo tem uma metáfora bastante eficaz para dizer esta experiência indizível justamente por não ter sido feita. O corpo é semeado corruptível e ressuscita incorruptível: “semeado na humilhação, ressuscita na glória; semeado na fraqueza total, ressuscita no maior dinamismo; semeia-se um corpo só com a vida natural, ressuscita um corpo espiritual” (1Cor 15,43). Esta vida consiste em estar, mais ainda, em ser com Jesus, o Filho unido ao Pai no único amor: “Estaremos para sempre com o Senhor” (1Ts 4,17). Agora na penumbra da fé, amanhã no face a face da glória, estaremos com aquele que veio estar conosco até à loucura da cruz para poder dizer-nos: “Hoje mesmo, estarás comigo no Paraíso” (Lc 23,43).
A ressurreição não vem de nós mesmos, mas é dom de Deus, e este dom é o centro da nossa fé cristã: “A mensagem central do cristianismo é: não há morte em que já não esteja presente o começo de uma nova vida. Não há cruz que não seja seguida da ressurreição. Não há escuridão em que já não brilhe a luz pascal, nenhuma dor em que somos deixados sozinhos” (Anselm Grün).
Professar a ‘ressurreição da carne’, significa professar que cremos no amor de Deus. Deus é eterno, e portanto, também o seu amor. E é nesse amor que confiamos de já, como amigos e amigas de Deus.
Dom Carlos Romulo – Bispo da Diocese de Montenegro